domingo, 24 de julho de 2011

Gazeta em forma de e-meio 119

O caçador de marxistas




O super-herói da foto foi preso em flagrante, sem resistência, realizando uma matança de jovens que faziam uma espécie de pic-nic numa ilha perto de Oslo. Tratado pela mídia hegemônica como “norueguês”, “atirador de Oslo”, “autor do atentado”, “suspeito”, entre outros títulos cordiais, mas nunca como terrorista (um lourão tão bem vestido de mocinho-de-filme-de-ação não faz o “perfil”, não é, “rapazes da imprensa”?), antes de ser preso ele havia explodido uma rua inteira no centro da cidade com vários carros bomba e assassinado ao menos 92 pessoas indefesas a sangue-frio, a maioria jovens entre 14 e 25 anos de idade.


Registre-se que, tão logo rolou a notícia das explosões, as agências de “notícias” apressadas (CNN, inclusível) atribuiram-nas a um grupo terrorista islâmico que “já havia assumido a responsabilidade pelo atentado”. Aí estaria o “perfil”: os barbudos morenos de Maomé.


O visionário Jean-Luc Godard tem toda razão quando disse numa entrevista recente que “agora todo mundo é autor” e que “até mesmo os noruegueses podem fazer filmes tão ruins quanto os americanos” (ver Kynoma - http://kynoma.blogspot.com/2011/07/godard.html).


Sem dúvida, o “autor do atentado” é também, além de norueguês, autor de um tecnicamente bem cuidado audiovisual e um “profundo” livro-manifesto que a ambos tratou de publicar na internet pouco antes de sair para a heróica cruzada. Sim, leitor, o cara se julga um cruzado do século 21 e se respalda num denso manual ideológico de fazer inveja ao Pentágono e à OTAN. São mais de 1.500 páginas de word onde o maníaco se justifica e se autonomeia “caçador autorizado de marxistas e de traidores multiculturais” à partir da “elementar” constatação de que a Europa encontra-se totalmente à mercê dos marxistas e do “comunismo internacional”, e do “islamismo fundamentalista” e seus “terroristas”.


Numa rápida leitura (bem) dinâmica do imenso documento, lê-se coisas do arco-da-velha. Por exemplo: todos os europeus natos que não pensam como ele são classificados de “traidores multiculturais” (dos “tipos A, B e C”), os quais devem ser eliminados por várias táticas de matança tramadas e descritas em detalhes pelo “autor”. A predileta parece ser a de buscar “alvos desprotegidos”, tais como reuniões de partidos, congressos científicos, festivais de estudantes, eventos culturais, etc, para se obter mais eficiência na “limpeza”, ao invés de perder tempo e correr riscos contra alvos bem protegidos. Em seu “raciocínio”, autoclassificado de “lógico” e “pragmático”, ele “deduz” que estudantes (todos, “futuros comunistas”), além de indefesos, são alvos mais prioritários do que um chefe de estado, p. ex., pois as cagadas deste estão feitas e as dos daqueles, por fazer. Logo!... se estará “limpando” o futuro, já que o passado sujo não tem mais jeito. E por aí vai...


Voltando a Godard, o que se constata dessa mais recente produção norueguesa é que, insistimos, ele tem toda razão. Vivemos a época da boçalidade tecnicamente bem equipada para produzir “idéias”. A inteligência e o talento não são mais exigidos uma vez que os recursos estão disponíveis a qualquer um e ambos, inteligência e talento, podem ser obtidos (comprados) “artificialmente”, até por quem não os possui, através das diversas “ferramentas disponiblizadas” (sic) seja na “web”, seja no “mercado”.


Sem saudosismos, o que este gazeteiro quer dizer é que há menos de quatro décadas uma “produção” dessas era absolutamente inviável e o autor teria de curtir suas “criações” num manicômio assim que começasse a rascunhar os primeiros manuscritos.


Era uma época em que até para ser presidente dos Estados Unidos o sujeito precisava ao menos parecer inteligente e demonstrar algum talento para a política. Nem se diga então o quanto de talento e inteligência eram necessários para escrever um livro de 1.500 páginas ou realizar um filme, mesmo um de curta-metragem. E sem o filme e o livro para se exibir ao mundo esse norueguês não iria sair matando as pessoas. Tal como os caras da OTAN e do Pentágono, ele é um boçal alucinado mas não um idiota.


A Humanidade precisa se cuidar melhor e é bom ter mais cuidado com a internet, pois, como diz o meu amigo Valdemar Gravura, ela pode ser “uma faca de dois legumes”.


E, mais uma vez, leitor, haja aspas para estes tempos ásperos.