sábado, 26 de junho de 2010

Gazeta em forma de e-meio 113

Fidel Castro, o mais experiente estadista vivo e o homem mais bem informado do planeta, ao menos na opinião deste gazeteiro, tem escrito, ao longo dos últimos quatro anos, uma série de artigos de fundamental importância, os quais, além de serem leitura obrigatória nos espaços de poder em todo o mundo, gostem ou não dele, vêm iluminando a consciência, o conhecimento e a opinião de todos os que nos interessamos e lutamos pela paz, pela vida e pela natureza nesta nossa única e ameaçada nave espacial - o Planeta Terra.

Hoje, a Gazeta rompe seu recesso para traduzir e divulgar em nossa língua esta reflexão que Fidel Castro acaba de publicar no site Cubadebate, e que já está reproduzida em inúmeros sites de língua espanhola.


Como eu gostaria de estar equivocado!

Fidel Castro Ruz
Havana, 24 de junho de 2010.


Quando estas linhas forem publicadas no Granma amanhã, sexta-feira, o dia 26 de julho, data que sempre recordamos com orgulho a honra de haver resistido aos embates do Império, estará distante, apesar de só faltarem 32 dias.

Os que determinam cada passo do pior inimigo da humanidade – o imperialismo dos Estados Unidos, uma mescla de interesses materiais mesquinhos, desprezo e subestimação às demais pessoas que habitam o planeta – calcularam tudo com precisão matemática.

Em 16 de junho escrevi: “entre um jogo e outro da Copa do Mundo, as diabólicas notícias se vão produzindo pouco a pouco, de um modo tal que ninguém se ocupe delas". O famoso evento desportivo entrava então em seus momentos mais emocionantes. Durante 14 dias, as equipes de futebol integradas pelos melhores jogadores de 32 países estarão competindo para avançar até as oitavas de final; depois virão sucessivamente as quartas de final, as semifinais e a final do torneio. O fanatismo desportivo cresce incessantemente, cativando centenas de milhões e talvez bilhões de pessoas em todo o planeta.

Agora, é o caso de perguntarmos: quantos sabem que, desde o dia 20 de junho, naves militares norte-americanas, incluindo o porta-aviões Harry S. Trumman, escoltado por um ou mais submarinos nucleares e outros navios de guerra com foguetes e canhões muito mais potentes que os dos velhos encouraçados da última guerra mundial, navegam em direção às costas iranianas através do Canal de Suez?

Junto às forças navais ianques avançam navios militares israelenses, com armamento igualmente sofisticado, para inspecionar quanta embarcação parta para exportar e importar os produtos comerciais de que o funcionamento da economia iraniana necessita.

O Conselho de Segurança da ONU, atendendo a proposta dos EUA, com apoio da Inglaterra, França e Alemanha, aprovou uma dura resolução contra o Irã, que não foi vetada por nenhum dos países que ostentam esse direito. Outra resolução mais dura foi aprovada por acordo do Senado dos EUA. Posteriormente, uma terceira, ainda mais dura, foi aprovada pelos países da Comunidade Européia.

Tudo isto, antes de 20 de junho, o que motivou uma viagem urgente do presidente francês Nicolás Sarkosy à Rússia, segundo notícias, para entrevistar-se com o chefe de Estado desse poderoso país, Dmitri Medvédev, com a esperança de negociar com o Irã e evitar o pior. Porém, só nos resta calcular quando as forças navais dos EUA e Israel se encontrarão frente à costa do Irã, unindo-se ali aos porta-aviões e demais navios de guerra norte-americanos que montam guarda naquela região.

O pior é que, tal como os EUA, Israel, seu gendarme no Oriente Médio, possui moderníssimos aviões de ataque e sofisticadas armas nucleares fornecidas pelos EUA, que o converteu na sexta potência nuclear do planeta por seu poder de fogo, entre as oito reconhecidas como tais, que incluem Índia e Paquistão.

O Xá do Irã fora derrocado pelo aiatolá Ruhollah Komeini em 1979, sem o emprego de uma só arma. Logo a seguir, os Estados Unidos impuseram uma guerra àquela nação com o emprego de armas químicas, cujos componentes forneceu ao Iraque junto com a informação requerida por suas unidades de combate e que foram empregadas por estas contra os Guardiães da Revolução Iraniana. Cuba tem conhecimento disso porque era então, como já explicamos outras vezes, presidente do Movimento dos Países Não Alinhados. Conhecemos bem os estragos que causou na população iraniana. Mahmud Ahmadinejad, hoje chefe de Estado do Irã, foi chefe do sexto exército dos Guardiães da Revolução e chefe dos Corpos de Guardiães nas províncias ocidentais do país, que levaram o peso principal daquela guerra.

Hoje, em 2010, tanto os Estados Unidos como Israel, depois de 31 anos, subestimam o um milhão de homens das Forças Armadas do Irã e sua capacidade de combate por terra, e as forças de ar, mar e terra dos Guardiães da Revolução. A estas, se acrescentam os 20 milhões de homens e mulheres, entre 12 e 60 anos, escolhidos e treinados sistematicamente pelas diversas instituições armadas entre os 70 milhões de pessoas que habitam o país.

O governo dos Estados Unidos elaborou um plano para levar a cabo um movimento político que, apoiando-se no consumismo capitalista, dividisse os iranianos e derrocasse o regime. Tal esperança é já inócua. Chega a ser risível pensar que, com as naves de guerra estadunidenses, unidas às israelenses, despertem as simpatias de um só cidadão iraniano.

Por minha parte, acreditei inicialmente, ao analisar a atual situação, que a contenda começaria pela península da Coréia, e ali estaria o detonante da segunda guerra coreana que, por sua vez, daria lugar à segunda guerra que os Estados Unidos imporiam ao Irã. Agora, a realidade levou as coisas ao sentido inverso: a guerra do Irã desencadeará de imediato a da Coréia. O governo da Coréia do Norte, que foi acusado pelo afundamento da corveta sul-coreana Cheonan, e sabe de sobra que aquele navio de guerra foi afundado por uma mina que os serviços de inteligência ianques lograram colocar no seu casco, não esperará um segundo para atuar, tão logo no Irã se inicie o ataque.

É muito justo que os torcedores de futebol desfrutem as partidas da Copa do Mundo. Cumpro somente o dever de exortar o nosso povo, pensando sobretudo em nossa juventude, cheia de vida e esperanças, e especialmente em nossas maravilhosas crianças, para que os fatos não nos surpreendam, absolutamente desprevenidos.

Dói-me pensar em tantos sonhos concebidos pelos seres humanos e as assombrosas criações de que foram capazes em apenas uns poucos milhares de anos. Quando os sonhos mais revolucionários estão se cumprindo e a Pátria se recupera firmemente, como eu gostaria de estar equivocado!

Tradução: Mario Drumond
Revisão: Frederico de Oliveira