sexta-feira, 27 de março de 2009

Gazeta em forma de e-meio 81

Porão Radical

Foi lendo Álvaro Vieira Pinto que me veio essa última inquietação que agora motoriza minhas idéias. Se ele tivesse a ferramenta que hoje temos para expressar nossos pensamentos e ao mesmo tempo publicá-los, com certeza ele se valeria dela. Não nos deixaria esperando três ou quatro décadas, ou mais, se não tivéssemos a sorte de seus originais terem sido descobertos recentemente. E se conhecêssemos as idéias dele há trinta, quarenta anos... bem, isto é assunto para outras gazetas, não esta.

Aqui não vai comparação nenhuma. Como propôs o próprio Vieira Pinto, “discutidas as imperfeições e limitações individuais”, o que temos a fazer é permanecer criando, pensando e, já que temos os meios... publicando. Inclusive o que pensamos e criamos antes e publicamos em círculos mais ou menos restritos, ou não publicamos, seja por acanhamento diante da nova ferramenta, seja por que ela não existia.

Vamos a conocernos”, um bom lema que foi proposto pela TeleSur desde que começou a transmitir, há uns quatro ou cinco anos. Não é babaquice peace and love, longe disso; é o que precisamos mesmo fazer, de verdade e para valer, tal como na Venezuela estão fazendo os compañeros de lá.

Há anos venho debatendo com José Sette, Fredera, Guilherme Vaz, Izabel Costa, Gilberto Vasconcellos, Beto Vianna, Rodrigo Leste, outros companheiros e leitores da Gazeta, sobre o que fazer no e com o novo meio. Não somos poucos; li há uns dias sobre isso no site Rebelión: “ahora es el momento de hacer experimentos, muchos, muchos experimentos”. Quer dizer, todo mundo está diante da mesma interrogação.

Foi de Gilberto a proposta do Porão Radical: “atualmente, pensar só é possível num porão, meu caro; na sala, não” – respondeu-me, contrapondo o meu projeto de criar uma “sala radical” na internet.

Mas, é inegável, a grande barreira para a nossa turma de jovens cinquentões tem sido a do domínio da ferramenta. Eu mesmo, que nunca tive pruridos com os diabos da tecnologia, e, de certa forma até tiro o meu ganha-pão com a ajuda deles, confesso a preguiça que me bate diante das janelas, cliques e teclas que tenho de manobrar para conseguir alguma coisa na tela que eu aceite como minha.

Fredera saiu na frente. Tão logo O Apito deixou de circular impresso, ele abriu o seu blog. Mas numa edição bem mais modesta, só de texto, e que ele atualiza regularmente, uma vez por semana, em média. E o blog dele já foi até censurado! José Sette veio em seguida, também com o seu blog; porém, com o dinamismo gráfico-visual que lhe é típico, além de não vacilar diante de traquitanas de tecnologia, mesmo que vá aos trancos e barrancos, na raça! Este gazeteiro, que vinha na moleza dos e-mails, então meditou que se o Fredera e o José Sette podem, por que não ele? E é o que recomenda a todos: se o gazeteiro pode... etc.

A Gazeta tem agora o seu blog. E mais, tem(os) também o apoio de um site, o qual já (nos) serve para arquivar e linkar coisas, mas é papo para depois. Subordinados ao blog da Gazeta, criei três outros blogs (entre eles, o do Suplemento Literário, com a novela que está no ar) e linkei os blogs do Fredera e do José Sette como “links aliados”. Tudo ainda no começo, cheio de lacunas, em fase experiência, de muchos, muchos experimentos. É como se vivêssemos uma nova era das “grandes navegações”. E de descobertas.

É a proposta do Porão Radical, que haverá de ser criado no site que mencionei para entrelaçar e potencializar toda a nossa fundição de cuca expressa nos diversos blogs e demais formas de comunicação via web que cada um de nós possa publicar. Cada um na sua, fazendo o que pode ou o que quer, criando, pensando e publicando - aí é que mora o barato. Incluindo, evidentemente, a produção dos que já desceram na última estação; os que têm os maiores aportes de contribuição, como é o caso do Álvaro Vieira Pinto e da infinidade de mestres do passado, não importando o quão distante no tempo estejam.

Vamos, então, começar e recomeçar:

- Conhecem este jovem?













Sim ou não? Confiram no blog da Gazeta:

http://blogdagazeta.blogspot.com

Aproveitem e dêem um passeio pelo blog, clicando onde der para clicar. Vão encontrar coisas desse gazeteiro por lá, sem qualquer compromisso. Assim também, a este gazeteiro agrada muito dar um passeio em coisas de outros como ele. Sempre sem compromisso, claro. Mas, desde que na direção do Porão Radical; que haverá de ser o reduto dos não alinhados e da freguesia assídua do wébico, espiritual, metafísico e, antes de tudo, libertário Café Novo Mundo.

segunda-feira, 16 de março de 2009

Gazeta em forma de e-meio 80

Ecos e respostas

As indagações deste gazeteiro formuladas na Gazeta 79 começam a encontrar ecos e respostas em algumas páginas da web. O site RedVoltaire (http://www.voltairenet.org/) publicou um texto do General Leonid Ivashov, ex-comandante-em-chefe das Forças Armadas da Rússia e atual vice presidente da Academia de Geopolítica de Moscou. Segundo o site, ele é uma das pessoas mais bem informadas do mundo.

O texto do general já abre assim (em tradução livre, do espanhol, deste gazeteiro):

“A experiência da Humanidade demonstra que o terrorismo surge onde quer que se produza o agravamento das contradições em determinado momento, onde as relações começam a degradar-se no seio da sociedade e onde a ordem social sofre modificações; ali onde aparece a instabilidade política, econômica e social, onde se liberam potenciais de agressividade, onde decaem os valores morais, onde triunfam o cinismo e o niilismo, onde se legalizam os vícios e onde a criminalidade cresce aceleradamente.”

Vamos ter de nos fixar nos pontos mais pertinentes ao nosso propósito indagador, pois é um texto relativamente longo que analisa com acuidade aquilo que o autor chama de “crise sistêmica da civilização”, a qual, para ele, foi desatada pelos que provocaram os acontecimentos de 11 de setembro de 2001.

“A ausência de novas idéias filosóficas, a crise moral e espiritual, a deformação da percepção do mundo, a difusão de fenômenos amorais contrários às tradições, a competição pelo enriquecimento ilimitado e o poder, a crueldade, levam a humanidade à decadência e, quiçá, à catástrofe.” (...) “A análise da essência dos processos de globalização, assim como das doutrinas políticas e militares dos EUA, demonstra que o terrorismo favorece a realização dos objetivos de dominação mundial e a submissão dos Estados aos interesses da oligarquia mundial. Isto significa que o terrorismo não constitui por si mesmo um ator dessa política, senão um simples instrumento, o meio para instaurar uma nova ordem unipolar com um centro de mando mundial único, para eliminar as fronteiras nacionais e garantir o domínio global de uma nova elite. É precisamente esta última o principal ator do terrorismo internacional, seu ideólogo e seu ‘padrinho’.” (...) “O principal alvo dessa nova elite é a realidade natural, tradicional, histórica e cultural que assentou as bases do sistema de relações entre os Estados, da organização da civilização em Estados nacionais, da identidade nacional.”

E, um pouco mais à frente:

“O atual terrorismo internacional é um fenômeno que consiste, para estruturas governamentais e não governamentais, em utilizar o terror como meio de alcançar objetivos políticos, desestabilizando e aterrorizando as populações nos planos sociais e psicológicos, desmotivando as estruturas do poder de Estado e criando condições que permitam manipular a política do Estado e o comportamento da cidadania. O terrorismo é o meio de fazer a guerra de maneira diferente, não convencional. Conjugado com os meios de comunicação, o terrorismo se comporta como um sistema de controle dos processos mundiais. É precisamente a simbiose entre os meios de comunicação e o terror o que cria as condições favoráveis aos grandes transtornos na política mundial e na realidade presente.”

Tal argumentação, vinda de quem vem, nos é mais que suficiente para explicar os comportamentos de certos braços do poder, como a NASDAQ e a Igreja Católica, denunciados na Gazeta 79. O terror pode ser difundido de várias maneiras nas populações urbanas e rurais, e é a infância a época da nossa vida mais vulnerável aos seus efeitos.

Aterrorizar publicamente uma criança, como fez o bispo de Recife ao punir com a excomunhão, a pena mais grave de todas no direito canônico da Igreja Católica, a mãe dela e os responsáveis pelo aborto legal que nela se procedeu, culpando-a, portanto, da “calamidade” que recaiu sobre os que salvaram a sua vida ameaçada pelo crime hediondo de um estupro cometido pelo próprio padrasto, é o mesmo que dizer a todas as crianças que elas tratem de se comportar e se submetam aos estupradores em silêncio obediente e submisso, sem criar complicações.

Assim como fazê-las conviver com o macabro e o hediondo em exposições pseudo didáticas, projetadas para ludibriar e anular os valores humanistas e espirituais que devem ser cultivados desde a infância e acostumá-las à indiferença em relação à morte e ao sangue derramado do próximo.

Tudo é cálculo nessa conspiração que está longe de ser uma “teoria”, pois se faz presente cada vez mais no dia a dia das pessoas e se assume a cada dia mais visível e evidente quanto aos seus propósitos terroristas. E a mídia hegemônica faz a sua parte, como no caso de Recife, ao propagar o escândalo sem nele tomar posição alguma.

Como nos informa o General Leonid Ivashov, “nesses episódios há sempre a presença obrigatória de três elementos: o que ordena que se realize, o organizador e o que executa.”

No caso de Recife, o bispo executou e o Vaticano organizou. No caso da exposição em Caracas, fechada pelo governo Chávez, uma empresa executou e a organização foi da NASDAQ. Em ambos os casos, a ordem só pode ter partido do mesmo centro de poder denunciado pelo general: a nova elite que se pretende global; os verdadeiros terroristas, que constituem a oligarquia do capitalismo mundial.

Se todo e qualquer empenho de resistência não tiver essa verdade na mira de suas ações, a humanidade estará correndo sério risco de se autoextinguir. Contudo, a Gazeta leva fé que é possível parar esses facínoras, e o primeiro passo nessa direção é o de tornar inofensiva a principal arma deles: a mídia hegemônica. E o melhor meio de combatê-la não é enfrentando-a diretamente; é ignorando-a, desprezando-a em todas as suas manifestações impressas, audiovisuais e eletrônicas. A indiferença do público será, com certeza, a arma mortal contra a sua monstruosidade que, em verdade, é apenas virtual; não é real. O que é real são as consequências dos atos de terror que difundem, com base na credibilidade que desfrutam imerecidamente de seus públicos. É, portanto, o ponto fraco, pelo qual se pode derrubar de vez essa hidra apocalíptica e seus amos terroristas, que já vivem os paroxismos das agonias infernais.

Isto foi agora demonstrado no caso da exposição de Caracas, onde a mídia hegemônica teve de conter seus ímpetos terroristas em vista da contradição que vive agora naquele país, que conquistou a sua soberania e no qual a indiferença da população já se manifesta no descrédito que confere à mídia hegemônica como um todo; em níveis local, regional, nacional e internacional. Lá, um governo revolucionário e soberano propicia à sua população alternativas reais e eficazes de comunicação e informação e as defende dos ataques terroristas que vão sendo contra ela (e contra nós, também, leitor, nunca nos esqueçamos, somos todos alvos “deles”) perpetrados pelos diversos agentes solertes da oligarquia mundial.

Leia o texto completo do Gal. Leonid Ivashov em http://www.voltairenet.org/article159257.html

quinta-feira, 12 de março de 2009

Gazeta em forma de e-meio 79 - Extra

Convite

Aos amigos do G.R.E.S. Cidade Jardim,
à comunidade do Conjunto Habitacional Santa Maria
e aos sambistas de Belo Horizonte

No próximo domingo, dia 15 de março de 2009, a partir das 10 horas da manhã, a nova diretoria do Grêmio Recreativo e Escola de Samba Cidade Jardim promoverá o

“Dia da Confraternização”

para marcar a data histórica da reocupação da nossa Quadra e do começo de uma nova e promissora fase da Escola de Samba.

Será um encontro informal no qual os membros da nova diretoria eleita vão expor os planos e projetos que vêm sendo debatidos internamente e, num ambiente de descontração e alegria, confraternizar com os nossos amigos e vizinhos.

Aproveitaremos para reinaugurar a cozinha com uma feijoada da Marlete.

Uma nova história para retomar a glória de uma antiga história: a da vitoriosa Escola de Samba Cidade Jardim, estandarte da nossa cidade, que em 13 de abril próximo completará 48 anos de serviços prestados ao nosso samba e à nossa cultura.

Nós os convidamos a fazer parte desta história.

A diretoria do G.R.E.S. CIDADE JARDIM
(chapa “Resistência: Volta por Cima”)

Presidente: Alexandre Silva Costa (Li)
Vice-Presidente: Maria Aparecida Amaral (Cidade)

1º Secretário: José Guilherme Castro
2º Secretário: Misael Avelino dos Santos

1º Tesoureiro: Marcos Fragoso Borges (Yé Borges)
2º Tesoureiro: Raphael de Oliveira (Visconde)

Diretor Social: Julio Cesar de Souza
Diretor de Salão: Marlene dos Santos Costa
Diretor Artístico: Décio Novielo
Diretor de Relações Públicas: Mario Drumond
Diretor Social e Tecnológico: Eric Maciel
Diretor de Patrimônio: Altair de Souza Coelho

Conselho Deliberativo: Edvaldo Farias (Didi);
Luis Carlos Bernardes (Peninha); Rafael Neves

Suplentes: Ana Eliza de Souza (Dona Eliza); Izabel Costa

Conselho Fiscal: Joviano Mayer; Alexandre Brandão (Xandão); Eduardo Xavier (Dudu)

Suplentes: Rita Efigênia Silva; Euller Nazareth dos Santos; Maria de Cássia Salles

Assessoria Jurídica: Rodrigo Brandão Castelo Branco; Rafael dos Santos Madanelo

Quadra do G.R.E.S. Cidade Jardim:
Rua dos Gentios, 1415 - Bairro Luxemburgo
(Conjunto Santa Maria)
Ônibus: 9208 e 9104, descer no ponto final;
4110, 4113 e 8207, descer na Av. Raja Gabaglia, 1710.

quarta-feira, 11 de março de 2009

Gazeta em forma de e-meio 79

Estranhas vibrações

O fechamento da exposição “Bodies Revealed” (Corpos Revelados), ocorrido semana passada num centro de convenções de um bairro chique de Caracas, por ordem do governo Chavez, dá o que pensar.

Do seu programa dominical “Alô Presidente”, Hugo Chavez justificou o ato com base nas leis da Revolução - que proíbem a exibição de cadáveres humanos, bem como a difusão de imagens por qualquer meio impresso ou eletrônico, exceto quando em ritos fúnebres legalmente reconhecidos, e com a devida autorização dos familiares e das autoridades competentes -, e denunciou o evento:

“São restos humanos, e em nossos narizes; estamos diante de algo macabro. É um signo que evidencia a imensa decomposição moral que assola este planeta. E neste planeta estamos fazendo uma revolução que tem de começar por ser espiritual e ética, ou não será nada”, disse ele.

A exposição se constitui num evento de alto luxo (o ingresso custa cerca de 30 dólares) e super produzido em Atlanta, EUA, que se apresenta como de natureza “didática” e, não declarada mas subrepticiamente, reivindica para si duvidosas validades “artística” e “científica”.

Para conseguir autorização na Venezuela, os responsáveis declararam nos trâmites oficiais que se tratava de bonecos de plástico que imitavam à perfeição o corpo humano e suas entranhas: “Veja como você é por dentro”, proclama o evento em suas peças de propaganda. Porém, a partir da denúncia de um jornalista, as autoridades descobriram que são cadáveres humanos reais “polimerizados”. O próprio site da empresa de Atlanta, uma tal Premier Exibitions Inc., informa que são, de fato, cadáveres reais.

Mas não responde convincentemente às perguntas do jornalista Antonio Aponte, publicadas no Diaro Vea, de Caracas: “Estes cadáveres, de quem são? Por que estão insepultos?” Alegam serem corpos doados a universidades, porém, sem informar quais delas, de quem são e por quem estão autorizados a exibi-los, comercialmente, não somente em completa nudez, mas até às entranhas mais profundas ou aos pedaços. As investigações do jornalista apontam para um mercado negro de cadáveres de origem asiática e de sistemas penais corruptos.

Entre outras questões, estes fatos dão o que pensar:

a) Pelas fotos e vídeos de reportagem (sem closes nos cadáveres) e pelas exibidas no site da empresa produtora (com closes e detalhes, e incluindo crianças observando-os com admiração), tudo aquilo é feito com altíssima tecnologia e uma montanha incalculável de recursos de toda ordem, principalmente financeiros. No entanto, não há chancela de entidades de naturezas didática, científica ou artística, nomes de pessoas e profissionais envolvidos, nem menção de apoios, patrocínios ou fontes de tantos recursos. A empresa apenas declara ter ações negociadas na NASDAQ.

b) Por que, dispondo de tantos recursos e de tecnologia de sobra, os responsáveis (ocultos em anonimato) optaram pelo uso de cadáveres reais ao invés de imitações em materiais que permitem chegar à cópia quase perfeita das formas humanas, sem ofensa aos direitos humanos, à espiritualidade religiosa e aos sentimentos humanistas, além de satisfazerem com real eficácia a alegada natureza “didática”, possibilitando até, se o quisessem mesmo os responsáveis, a busca de valores verdadeiramente artísticos e científicos dos objetos expostos?

c) O silêncio da mídia hegemônica mundial diante de mais um “ato de censura e despotismo da ditadura de Hugo Chávez, na Venezuela”.

Este gazeteiro não sabe bem por que, mas intui que há algo muito sutil que liga aqueles acontecimentos na Venezuela aos fatos ocorridos aqui no Brasil relacionados com o estupro de uma criança de nove anos e o aborto legal dos fetos que nela foram gerados.

Pois dá o que pensar:

Por que a Igreja Católica, também uma “trade mark” com ações na Dow Jones, optou por se posicionar pública e escandalosamente da forma que fez, excomungando a mãe da criança e os médicos, enfermeiras e toda a equipe do hospital envolvida nos trabalhos do aborto legal, inclusive os choferes de ambulâncias, ao mesmo tempo em que abriu as portas do perdão católico ao estuprador, sem sequer condená-lo (não vamos cair na ingenuidade de pensar que os hierarcas da Igreja brasileira e do Vaticano são tão burros assim)?

Aqui nota-se também, depois do escândalo, o silêncio da mídia hegemônica, tanto quanto a ausência completa de um posicionamento dela diante de ambos os fatos (o da Venezuela e o do Brasil).

Cadáveres comercializados em exposição aberta até para crianças; fetos abortados por estupro de uma criança, pedofilia mórbida, quase incestuosa: o sórdido e o macabro em evidência emulados pelo grande capital e pela Igreja Católica. Não pense o leitor que não há cálculo por detrás de tudo isso. Estranhas vibrações, e muito negativas. Devemos ter cuidado. E mais ainda com as nossas crianças.


Em tempo: pelo site da empresa produtora, a exposição “Bodies Revealed” até agora só tem agenda (schedule) para a Venezuela e para o Brasil. Por que será?

terça-feira, 10 de março de 2009

Gazeta em forma de e-meio 78

A nova Gazeta

Algumas reformulações vão sendo agora introduzidas na Gazeta para melhor aproveitar os recursos dessa nova possibilidade de comunicação que nos abre a Internet.

A Gazeta agora tem o seu blog: http://blogdagazeta.blogspot.com/

Ela continuará sendo enviada por e-mail mas ficará mais disponível em e-meio (meio de comunicação eletrônico). No blog o leitor encontrará os dois primeiros links já ativados da nova Gazeta:

- Suplemento Literário
- Todas as Gazetas

No segundo já se encontra disponível todo o Volume 1 (2007) e, em abril, será colocado o Volume 2 (2008). O volume atual estará sempre na página principal (as cinco últimas edições) e no seu próprio “Arquivo corrente”.

O Suplemento Literário da Gazeta propõe uma nova experiência neste laboratório de comunicações em que se transformou a Internet. Temos observado que, entre todas as linguagens da criação artística, a menos favorecida pelo novo e-meio foi a da ficção literária.

É que os textos longos são de fato mais difíceis de digerir quando lidos numa tela de computador. Assim, estamos lançando, na estréia do nosso Suplemento Literário, o que denominamos “Novela em forma de e-meio”, a primeira delas, de autoria deste gazeteiro, intitulada O esplendor do Império.

Ela será enviada a todos os leitores da Gazeta, capítulo por capítulo, à razão de um por dia, por e-mail. Mas, caso o leitor prefira desfrutá-la em seu próprio tempo ou ritmo, ela já se encontra disponível, na íntegra, na página do nosso Suplemento. Como prometido nas Gazetas anteriores, começaremos hoje a enviá-la; eis que, logo a seguir desta Gazeta, segue um outro e-mail com o seu primeiro capítulo.

Outros links gazeteiros já estão sendo pensados para melhor interação entre nós, simultaneamente leitores e gazeteiros.

Há no blog, também, os “links aliados”, com dois deles já ativados. Esperamos ativar outros mais, em breve.

E, como dissemos, a Gazeta continuará no seu aperiodismo livre, sendo remetida por e-mail e atualizada em e-meio sempre que este gazeteiro puder e achar que deve publicá-la como contribuição de informação e opinião.

segunda-feira, 2 de março de 2009

Gazeta em forma de e-meio 77

Em vista das muitas solicitações de leitores desejando conhecer o nome do pensador focado neste artigo, adiantamos a remessa desta Gazeta, com a sua terceira e última parte, e que satisfaz a justa curiosidade despertada.

O filósofo do “vale de lágrimas” III

Álvaro Vieira Pinto é o nome do nosso genial pensador recém revelado pelo exitoso trabalho editorial da Contraponto, de César Benjamin, que já trouxe à luz cerca de 1.800 páginas, em três volumes de livros, da obra inédita deixada pelo autor em manuscritos de próprio punho ou datilografados para a posteridade. Ao que se sabe, nunca o autor buscou um editor para publicá-los ou uma instituição pública que conservasse seus originais. Preferiu deixá-los sob a guarda de parentes e conhecidos talvez porque os intuía capazes de conservá-los, se não pelo interesse intelectual, pelo carinho respeitoso à memória do autor. Intuía também, com certeza, a inutilidade de levar a editores seus contemporâneos os volumosos e explosivos originais que produziu, ainda não se sabe a que quantidade, bem como a de deixar à incompetência e à irresponsabilidade das instituições públicas que sustentamos para tais fins a guarda de tão vulneráveis quanto facilmente destrutíveis folhas de papel em que se cristalizaram seus pensamentos.

Filósofo e matemático, foi catedrático da Faculdade de Filosofia da Universidade do Brasil (hoje UFRJ) e ganhou projeção ao participar do grupo fundador do célebre Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB), cujo departamento de Filosofia dirigiu. Segundo César Benjamin, em texto de orelha dessa última publicação, “incursionou pela sociologia, a pedagogia, a história, a linguística e a demografia”. Em vida, publicou, ao que conhecemos, apenas um opúsculo, quase um panfleto sobre a política de ensino superior e a universidade no Brasil, além de artigos em jornais. No advento do golpe de Estado de 1964, foi relegado ao ostracismo e nele permaneceu, compondo solitária e quase secretamente sua obra de pensamento, até falecer, em 1987. Ainda não se sabe se nos três volumes recém publicados e nos poucos textos que o autor publicou em vida estaria contida toda a sua obra, mas acredita-se que novos tesouros estão para ser descobertos e revelados.

Não é a primeira vez que a história registra fenômenos assim em nossa região do “vale de lágrimas” e com certeza não será a última. Contudo, por mais devastadores sejam os efeitos dessa conspiração contra nossas populações, economias e culturas, verifica-se entre “nós” uma persistente e sempre mais lúcida resistência para enfrentá-la, ao mesmo tempo em que se registra um nítido retorno não previsto, não dimensionado e não controlável dessa mesma conspiração atingindo em cheio os “pés de barro” do próprio Império que a patrocina: um verdadeiro canhonaço saindo pela culatra!

Agora que, finalmente, os róseos dedos da aurora começam a surgir nos horizontes sombrios do “vale de lágrimas” – trazendo o novo dia que haverá de encerrar “a longa noite ártica da inteligência” -, é previsível que apareçam inúmeras obras importantes que, tal como as de Vieira Pinto, foram produzidas em ignotos esconderijos do trabalho intelectual por ignorados pensadores da nossa realidade.

Que elas também nos ofereçam substâncias valiosas de crítica e análise para o alicerce das novas bases sociais, políticas e culturais revolucionárias de que necessitaremos para o desfrute do novo dia que muito em breve amanhecerá para os nossos povos, uma vez que a sua aurora já se faz notar em diversas latitudes e longitudes da nossa Pátria Grande.

Nós mesmos temos notícias de muitas delas; o leitor, com certeza, também.

E este gazeteiro retorna à leitura do volume.


A nova Gazeta,
com as reformulações feitas durante a breve pausa para meditação, aos poucos irá se definindo. Anunciamos, desde já, o lançamento do nosso Suplemento Literário, com uma inovação na linguagem web:

AGUARDEM, a partir de terça-feira, 10 de março:



Novela em forma de e-meio
(Suplemento Literário da Gazeta em forma de e-meio)

por Mario Drumond

33 capítulos publicados ao ritmo de um capítulo por dia, todos os dias.
Da série Escritos anti-imperialistas
Escrita entre 11 de setembro e 30 de dezembro de 2008.
Belo Horizonte – Brasil

Revisão: Frederico de Oliveira

Gazeta em forma de e-meio 76

O filósofo do “vale de lágrimas” II

Na primeira parte demos alguns trechos recolhidos das páginas iniciais do belo volume de 430 páginas que resultou desse admirável manuscrito, intitulado A Sociologia dos países subdesenvolvidos, depois do competente trabalho tipográfico e editorial que o trouxe à luz.

Mas, para além do magnífico tratado de sociologia que agora nos chega (não queremos economizar a adjetivação elogiosa dessa obra prima), o que nos entusiasma na obra desse autor é a surpreendente atualidade de sua argumentação sempre exaustiva, nunca tardia e formulada a partir de uma cristalina lucidez dentro de uma mais que vanguardista visão do mundo. Muitas das questões ali colocadas há mais de trinta anos ainda hoje mal começam a ser tratadas publicamente, e até os mais bem preparados autores atuais não alcançam tratá-las nos mesmos níveis que ele. Sua obra, produzida solitariamente há mais de três décadas, possui a rara virtude de ser, na posteridade, não somente oportuna, mas capaz de atualizar novos estudos, ou em elaboração, mesmo os que se acham em estágios avançados do conhecimento.

Já conhecíamos linha por linha da sua genialidade autoral nas 1.400 páginas que foram publicadas em dois grossos volumes pela mesma editora, em 2005, a partir de originais datilografados pelo pensador no final dos anos 60 e início dos 70: O Conceito de Tecnologia.

Este gazeteiro tem por ganha-pão o trabalho de inventor independente nesse malfadado campo do saber, a tecnologia, e pode assegurar que os estudos teóricos a ele dedicados, mesmo os mais autorizados, não logram validade de sequer uma década. Em média, duram meia década, não mais, logo quando se prescrevem conceitos, técnicas, termos, produtos e pensamentos que tratam, dada a vertiginosa e irracional competição “inovadora” a que o tema é submetido semântica, comercial e ideologicamente.

No entanto, este gazeteiro ainda não encontrou matéria mais atual e atualizadora nessa disciplina do que aquele exaustivo tratado, no qual o autor desmantela e desmistifica a mitomania endeusadora de máquinas “inteligentes” e seus pseudodemiurgos, além de desmascarar a falsa genialidade atribuída aos últimos, quase sempre submissos mental e ideologicamente aos interesses inconfessáveis de seus gerentes e patrões.

O Conceito de Tecnologia é um mergulho em profundidade abissal, crítico e analítico, no campo da Cibernética e as três ciências dela derivadas, que o autor, desde então definindo-as e classificando-as com pioneirismo e talvez em primeira mão, chamou de Robótica, Biônica e Informática. É a única obra dedicada ao tema que permanece atual na estante deste gazeteiro, fazendo-se alicerce de nossos trabalhos dedicados à cultura da memória e à ciência da informação, ao lado de autores consagrados em disciplinas bem mais perenes em suas construções teóricas como Antonio Houaiss (Bibliologia) e Lancaster (Arquivística).

Em certas passagens daquela obra, o nosso autor teve de criar neologismos para explicar fenômenos que antevia como resultantes das alucinações dos ‘futurologistas’ que prognosticavam um futuro dominado por máquinas “inteligentes” que prescindiriam da força criadora do trabalho humano, substituindo-o. Novas palavras, tais como managerismo (do inglês manager; gerente) - prevendo até a entronização de uma nova estética de gerente a protagonizá-lo, figura esta que hoje é conhecida pelo pejorativo yuppe -, antevendo a catástrofe que então se gestava, quase imperceptível, e que resultaria na base mesma do reinado neoliberal, responsável pelo inferno que causou e ainda causa às populações do mundo todo pela (super) valorização do burocrata (manager), forjador de riquezas abstratas, em detrimento do trabalhador, realizador de riquezas concretas. Temas e termos hoje vulgarmente usados como chip, hardware, software, informática e muitos outros são ali tratados com espantosa vigência de conteúdo numa época em que eram restritos a laboratórios de ponta das centrais de Inteligência da Guerra Fria, em caráter altamente confidencial e assim preservados a ferro e fogo pelos estrategistas dos poderes hegemônicos.

Mas em A Sociologia dos países subdesenvolvidos ele trabalha matéria bem mais delicada e ainda quase totalmente desfocada nas miradas da lógica, impossível de se decifrar pelos limitados recursos da lógica formal e somente possível de ser desvendada pela aplicação da lógica dialética, ferramenta que o autor maneja como ninguém mais.

E é com ela, utilizada em implacáveis raciocínios de rigor científico, e não com especulações formais, jornalísticas, místicas, paranóicas ou ocultistas, que ele desvenda e põe a nu a grande conspiração que historicamente tem sido levada a cabo pelos centros de poder mundial contra nós (agora, sem aspas), os habitantes do “vale de lágrimas”, a fim de nos acreditarmos os culpados das desgraças que sofremos e nos manter nele, solidificados no statu quo da iníqua divisão da humanidade em classes sociais, que privilegia o mundo autodenominado “desenvolvido” e, em particular, seus núcleos de poder.

Ao decidir escrever este artigo, este gazeteiro encontrava-se na página 112 das 430 do livro. Portanto, há mais, muito mais. Mas, nessas primeiras páginas, já se conduzem os prólogos da contundente denúncia que penetra as entranhas da conspiração manipuladora da realidade que, como sabemos, nos é perpetrada principalmente nos veículos de mass media e nas universidades e demais “respeitáveis”instituições da ciência oficial.

Ela nos é servida em teses “sociológicas” pseudocientíficas, amplamente divulgadas e aceitas como absolutas, mas que tem por propósito “a translação da sociologia para outros campos do saber” (a psicologia, a biologia, a ética, etc) e respaldar fraudes doutrinárias que sustentam uma sempre alegada inferioridade dos habitantes do “vale de lágrimas”, por razões “naturais”, sejam psíquicas, raciais ou étnicas.

É no contexto de tais “trabalhos” que surgem “novas” expressões cuidadosamente elaboradas por “sociólogos” serviçais para a manipulação “científica” do conhecimento: a deformação semântica, como o nosso pensador denominou tais processos que visam interferir na comunicação social para ocultar ou confundir a percepção do real.

Para exemplicar, termos como poluição, controle de natalidade, ecologia, ecossistema e outros que na época em que ele redigia essa obra mal começavam a frequentar as páginas de seções especializadas dos jornais como balões de ensaio de tal “sociologia”, são por ele desmascarados e desvendados em suas secretas definições no contexto da histórica conspiração manipuladora das sociedades, que denuncia.

Foi quando chegamos ao ponto do livro em que o autor trata uma das mais ardilosas deformações semânticas, contra a qual temos procurado ansiosamente promover o debate e a denúncia através da imprensa, mas em vão e absolutamente sem eco, que encontramos, enfim, a primeira resposta aos nossos chamados e decidimos por escrever o presente artigo. Além do que, ela foi, para “nós”, atualizadora e complementar ao que havíamos pensado e escrito a respeito.

O ardil a que nos referimos vem sendo vulgarmente disseminado e difundido no conceito solerte que passou a se introduzir em determinados usos da palavra “grupo”, e que, no decorrer das três últimas décadas, vem causando à nacionalidade danos perturbadores e até catastróficos.

No “vale de lágrimas” não mais nos é dado desfrutar, no firmamento da inteligência, a brilhância estelar maior nas pessoas e realizações autorais de nossos gênios criadores, inventores e artistas. Não, aqui as conquistas das artes, das ciências, da indústria e do saber, quando podem se manifestar, passaram a ser atribuídas a “grupos” industriais, financeiros, artísticos, empresariais, etc. Atualmente, no “vale de lágrimas” só nos é concedido o brilho menor ou a opacidade dos “astros” das telenovelas, dos esportes, dos programas de auditório e dos reality shows.

Damos a seguir umas poucas linhas das muitas que compõem as reflexões do genial autor sobre tal conceito e respectiva deformação semântica:

“O conceito de ‘grupo’ traz inúmeras vantagens [para os manipuladores de sociedades], que, por necessidade, reduziremos a duas principais: a) a supressão do indivíduo enquanto tal que é sempre uma presença ameaçadora, pois nunca se sabe, tratando-se do homem livre, e especialmente do trabalhador, se será dócil ou recalcitrante em sua realidade existencial. Daí ser útil ocultá-lo, escamotear o significado, que tem, de unidade essencial da sociedade, para introduzir em lugar dele o ‘grupo’, apresentado evidentemente na condição de dado concreto, objetivo, irredutível (...) b) praticar a operação lógica de abstração formal, a fim de passar do ser humano concreto, com suas qualificações inalienáveis e inconfundíveis, ao ‘grupo’ amorfo, ou dotado de especificações que arbitrariamente nele são reconhecidas [pelos manipuladores]. (...) E tudo pela simples razão de que, se o homem é sempre alguém, o ‘grupo’ não é ninguém. É apenas uma figura de retórica, concebida de acordo com as conveniências para efeito das combinações, classificações, distribuições e, sobretudo atribuições que devam receber [dos manipuladores].”

Tal conceito de “grupo” tem sido amplamente utilizado nas políticas públicas relacionadas com a nossa produção cultural, em todas as áreas em que ela se pode manifestar pelo trabalho coletivo, e, mais especificamente, em três de suas expressões fundamentais: a música, a dança e o teatro. Em meados do ano de 2002, este gazeteiro escreveu uma série de artigos para a revista Caros Amigos, sob o título geral Arte sem artista? (não publicados) que contêm passagens como as que se seguem:

“Explica-se assim por que as artes cênicas brasileiras têm sido as vítimas prediletas dos manipuladores. Sem dúvida, nota-se no cenário da nossa produção cultural cada vez mais a presença de nomes de ‘grupos’ assinando trabalhos de arte representativa, ao invés dos nomes de seus principais actori (músicos, bailarinos e atores). Teatros, balés, performances musicais e outros espetáculos do gênero são agora anunciados como obras de determinados ‘grupos’, como se isso de fato pudesse existir.

“Assim, os proprietários desses ‘grupos’, geralmente empresários ‘culturais’ que nada fazem pela arte e pela cultura, usurpam sucessos que não são deles, principalmente os financeiros, que são os que mais lhes interessam. Tais empresários às vezes concedem aos actori a gentileza de publicar seus apelidos (Bel, Juca, Malu, etc) em ordem alfabética nas revistas-programa, mais ou menos como os fazendeiros apelidam as vacas de seus currais, e estão em conluio com burocratas e patrocinadores ‘culturais’, dividindo entre si os resultados realizados a cada empreendimento, com o apoio da mídia que recebe sua parte através da rubrica ‘divulgação’. (...)

“A forma mais fácil de conseguir esse objetivo é a eliminação do actor como indivíduo realizador da actio (ação cênica) e sua substituição - aos olhos do público mal informado - por um ‘grupo’ de actori sem nomes. Assim, o público é aparentemente conquistado pelo ‘grupo’ e não pelos artistas que sobem ao palco, e, como dizia Carlos Drummond, ‘expõem suas carnes às feras’. Será o nome do ‘grupo’ que o público levará na memória, pois ele é que é amplamente divulgado e interessadamente elogiado pela cumplicidade dos veículos de comunicação.”

Assim, e por vias dessa interação histórica no processo das idéias, genialmente proposta pelo autor a que dedicamos este artigo, recebemos em 2009 a resposta de um chamado que fizemos em 2002, sob a forma de um texto por ele composto nos anos 1970. Este gazeteiro não tem conhecimento de outro escrito, publicado ou não, sobre essa absurda deformação semântica, altamente prejudicial aos artistas nacionais e que vem provocando danos severos à produção contemporânea brasileira de arte e cultura. Caso o leitor saiba de algum, pedimos-lhe a gentileza de nos enviar ou nos endereçar a ele.

domingo, 1 de março de 2009

Gazeta em forma de e-meio 75

O filósofo do "vale de lágrimas" - I

“As religiões milenares, orientais e ocidentais, e as ideologias pessimistas esforçam-se em retratar o mundo no que a humanidade se tem desenvolvido, desde que, nos diversos grupos que a formam, se iniciou o regime da divisão social em classes antagônicas, utilizando a conhecida imagem do ‘vale de lágrimas’. Compreende-se que assim procedam. As primeiras, por necessidade, pois, se não convencerem os homens de que, por uma tristíssima fatalidade, têm de passar a existência no mais doloroso sofrimento, submetidos a toda espécie de privações, provações e por fim à morte, deixa de ter sentido seu papel com que se justificam, o de ser o único veículo de ‘salvação’ para nós, desgraçados viventes. As segundas porque, se não pressagiarem a impossibilidade absoluta de um destino melhor para as gerações humanas, sua função intelectual paralisante de mensagem provinda de um poder central explorador do trabalho das massas não só se tornará inútil, mas, ainda pior, daria oportunidade a essas últimas de conceberem a idéia de serem capazes por si mesmas de vencer tão calamitosa situação e construir um regime de convivência isento dos males e penúrias que atualmente as oprimem.”

Assim se abre esse extraordinário texto recém publicado (2008) do genial pensador de que tratamos neste artigo. O autor datou o manuscrito como inciado em 13 de agosto de 1974 e terminado e revisado em 13 de fevereiro de 1977. Segundo o organizador da edição, foi feito do próprio punho e “com uma letra extremamente pequena”, e a equipe de digitação precisou valer-se de “uma lupa potente para realizar a leitura”.

Ora, o Brasil, como toda a América Latina e o Caribe, configura-se em uma região importante desse imenso desfiladeiro de misérias humanas que é o “vale de lágrimas”, desde a invasão européia iniciada por Colombo, Cabral e outros. Pressupõe-se, a partir de códigos pré-estabelecidos nas matrizes do poder central, que tal lugar não é próprio para o pensamento científico ou artístico, muito menos o filosófico.

De fato, os mecanismos que são utilizados para tornar isso uma “verdade” não são fáceis de combater. Eis que

“Quando um país plenamente representativo do ‘vale de lágrimas’, em virtude do estado de atraso no desenvolvimento das forças econômicas e da opressão política de grupos dirigentes, que lhe tiram a liberdade de expressão do pensamento coincidente com os interesses das massas trabalhadoras, toma consciência de sua realidade, o filósofo que acaso venha a produzir e que se queira manter identificado ao destino do povo tem de proceder à difícil e penosa operação de dividir-se em sua condição existencial. É obrigado, às vezes por um período desoladoramente longo, a tornar-se ao mesmo tempo o sujeito criador das idéias libertadoras e o público, que as deve executar. (...) Deve sentir-se atuante nos dois papéis, o que é uma extraordinária façanha da liberdade individual. À falta de público, dada a circunstância da tirania reinante, tem de tornar-se o seu próprio público, esperando o dia em que os ‘outros’ efetivos o possam ouvir.”

Esses “outros” somos “nós” que o estamos ouvindo agora, 22 anos depois de sua morte. Vamos manter em “nós” as mesmas aspas que o autor deu aos seus “outros”, evitando assim a generalização de um universo que se limita sempre àqueles que se atrevem a resistir às forças invasoras, persistindo em ler, escrever e pensar sob condições extremamente adversas, uma vez que, ao que ousa fazê-lo

“(...) não lhe é permitido o silêncio, que neste caso se confundiria com a cessação do pensamento ou com o desânimo quanto às finalidades que cultua. Não pode deixar de falar, mesmo sabendo que o faz para si mesmo, e que só o escuta o papel que absorve as linhas que escreve. Porque, sob a forma idealizada de ‘público’, a voz que ouve não lhe parece a sua e sim a de quem ensina o que é preciso saber e diz o que se deve fazer. No ato do ouvir silencioso a voz, os lamentos e imprecações das multidões dispersas há uma crítica implícita, que é dada pelo exercício do pensamento indagador. Mortal seria o desistir de pensar, a ausência de percepção, ainda que interior e muda, o esquecimento da arma intelectual!”

A esse autor não seria novidade o advento da nova modalidade de escrita eletrônica que hoje podemos praticar, bem assim as possibilidades de sua instantânea distribuição mundial via internet, inovações tecnológicas para ele facilmente previsíveis, já que as conhecia em níveis teóricos os mais avançados, como se verá mais à frente. Mas, tendo sido ele um pensador que se expressava através da palavra escrita, ao seu tempo de vida não foi dada outra alternativa senão o labor solitário sobre a folha de papel.

Eis que, agora, para “nós”, autores que se expressam nas diversas artes e ciências e por vários meios, o público não mais se faz obrigatoriamente sob “a forma idealizada”, pois os nossos “outros” efetivos, por poucos que sejam, já nos podem ouvir de imediato, podendo também interagir, contribuir e dialogar com qualquer um de “nós”, “que acaso venha a produzir”. Ou seja, dispomos hoje de uma arma intelectual muito mais poderosa e, portanto, com mais motivos e mais forças para crer, como o filósofo, que

“No silêncio da reflexão aparentemente inútil é que a visão da realidade se aprimora, se desvenda em suas trágicas minúcias e se prepara para realizar em plena lucidez o contato com os ‘outros’, na plena força de uma eficácia invencível. O pensar nunca é inútil, porque conserva a vitalidade daquilo que os embrutecedores desejam acima de tudo destruir, a capacidade de a consciência crítica dizer a verdade, que a pressão asfixiante procura impedir seja conhecida. Se o pensador se omite no trecho obscuro, noturno do caminho, à espera do raiar do dia, não está compreendendo que é a sua meditação solitária e sem ressonância que, em parte, prepara o nascer do sol. Porque o dia não é apenas a luz física que a rotação dos astros traz com necessidade mecânica. O dia é a proclamação do novo saber, a palavra que definirá o que se espera, a idéia que se fará o ser da Humanidade emergente.”

E é assim, pois, que ele assume o seu engajamento na contenda:

“A verdadeira revolução é o desabrochar das novas idéias que as antigas fecundam pelo fato inevitável de se esgotarem. Mas é preciso que durante a calamidade o pensador que contempla antecipadamente a aurora esteja sem cessar entregue ao trabalho de observação, para depositar em algumas folhas de papel, cristalizada, a natureza dos tempos futuros a construir. (...) A condição, porém, para que o pensador de um país subdesenvolvido e sem soberania desempenhe este que é o seu único e justificável papel, consiste em se preparar pela prática permanente, pela ascese da dupla disciplina existencial, para a missão a que se dedica e executa na longa noite ártica da inteligência.”

Tal visão otimista sobre o dificílimo papel do filósofo em tais condições – e, como vimos, o autor, desde a primeira linha do texto, se coloca em posição crítica ou mesmo antagônica às igrejas milenares e às ideologias pessimistas – nada tem de banal nem de profissão de fé; ela é brilhante e cientificamente revolucionária:

“Deste modo, nosso desejo é aparecermos não como um filósofo conhecedor das vicissitudes do ‘vale de lágrimas’ que observa ao seu redor, mas como legítimo habitante dele, identificado até o mais profundo de sua essência humana e individual com os milhões de compatriotas e demais contemporâneos dispersos por toda parte do mundo subdesenvolvido, convencido de que esta suposta pobreza e inferioridade de visão, a de quem se recusa a escalar os píncaros circunstantes na suposição de que assim enxergaria melhor e mais longe a paisagem, é na verdade a sua principal, e de fato a única, superioridade, a que lhe é dada pela equiparação com os anseios das massas oprimidas. O resultado necessário de tal salutar atitude será uma consciência que, discutidas as imperfeições e limitações individuais, reflete fidedignamente as condições objetivas do mundo miserável, tem possibilidade de melhor descortinar soluções, e adquire o direito, que não pretende ser o dos profetas tribais antigos, mas o dos esclarecidos cientistas modernos, de proceder a denúncias que se revestirão de caráter filosófico definido, e irão constituir a sociologia dos espoliados em oposição à dos espoliadores.”