segunda-feira, 16 de maio de 2011

Gazeta em forma de e-meio 118

Este mundo é um hospício
(sem aspas, pois o filme do Capra fica “no chinelo”)

Passei dois dias e duas noites num hotel de cidade do interior e, no tempo vago, não tinha outra saída senão ligar a TV: lixo, lixo e mais lixo. A GloboNews estava 24 horas no ar com a façanha Obama x Osama; de manhã, de tarde, de noite e de madrugada, nas vezes que passei por seu canal. Numa delas, decidi ouvir o que falavam quatro senhores reunidos numa sala cenográfica. Um deles, o que falava mais, reconheci como um “jornalista” de variedades que às vezes é visto cobrindo um bueiro que vazou e outras entrevistando gente na rua. O rapaz era o mais empolgado com a façanha de seu amigo Obama. Falava como se acabasse de sair de uma reunião com “o Obama”, “a Hillary” e “o Gates”, e era assim que os tratava, como se os frequentasse na intimidade. Os outros também se assanhavam e quando conseguiam abrir a boca era para acrescentarem algo e mostrarem-se igualmente “bem informados”. “O Obama decidiu acabar com os inimigos da América” – dizia o empolgadão, entre anuências e apartes dos demais – “e decidiu que agora não tem mais protelações diplomáticas, conversa mole ou firulas demagógicas. O Kadafi, o Fidel, o Chavez, o Ahmadinejhad e outros ditadores menores já estão na mira”.

Na década de 70, se aqueles quatro fossem pilhados num delírio desses seriam imediatamente encaminhados ao hospital psiquiátrico mais próximo.

“Comunidade Internacional” é um termo sem significado objetivo que designa coisa inexistente, isto é, uma ficção (de má qualidade). Uma pesquisa exata do termo (entre aspas) que acabo de fazer no Google encontrou-o em 2.210.000 páginas web em língua portuguesa. Em espanhol, “comunidad internacional”, 4.240.000; em inglês, “international community”, 16.300.000 (o Google agora deu para “arredondar” a quantidade de seus “achados”). A globalização é uma ficção de má qualidade. Cuidado, leitor, ela pode levá-lo ao reino da fantasia onde, ao menos virtualmente, deve habitar a tal “comunidade internacional” devidamente disneyficada, macdonaldizada, plastificada e radioativa.

A palavra “terrorista” designa pessoa, conjunto de pessoas, entidade ou até coisa que revele patriotismo, que promova a soberania de sua nação, a autodeterminação de seu povo e atue ou lute para defendê-las. O sinal da TeleSur, por exemplo, é considerado pelo Congresso dos EUA como um “sinal terrorista”.

O “Ocidente” (outra palavra que tem sido usada, para além de sua significação geográfica, como um termo sem significado objetivo e que designa coisa inexistente) ficou barbarizado com a escândalosa notícia de uma mulher iraniana que teria sido condenada à “morte por apedrejamento” por ter cometido adultério. Todas as matérias mostravam a mesma foto de uma mulher vestida de negro em que só lhe aparecia o rosto, mas isto era o bastante para que todos vissem que se tratava de uma mulher lindíssima.

“Progressistas” de todos os matizes e níveis intelectuais, de classe, de poder político (até presidentes de repúblicas), inclusive notórios racistas e ao menos três dos sete sábios do Sion de “última geração” (Sarkozy, Aznar e Blair), esbravejaram aos quatro cantos contra a barbaridade em prolixas análises daquela atrasada sociedade muçulmana. Porém, só um jornalista, o francês Thierry Meyssan (RedVoltaire), decidiu investigar o caso e demonstrou que era tudo mentira (ver http://www.voltairenet.org/article167005.html, em espanhol). Uma completa mentira. Depois, internautas descobriram que a foto era a de uma modelo inglesa, e que tinha sido feita para um anúncio de cosméticos.

Um nota de conhecimento geral: a pena de apedrejamento por “crime de adultério” fora instituída por Moisés, Rei dos Judeus, e teria sido revogada por Jesus Cristo com o célebre desafio a quem atirasse a primeira pedra. Há mais de dois mil anos!

Todos os dias, em algum lugar das manchetes principais e de algum lugar da União Européia ou dos EUA, um sempre diferente senhor, sempre muito bem vestido e sendo apresentado como “autoridade” civil ou militar da “comunidade internacional”, fala a jornalistas muito bem vestidos e bem comportados para declarar sua “preocupação” com a população civil da Líbia e a necessidade de bombardeá-la para protegê-la da sanha assassina do “ditador” que a governa. O discurso é sempre breve e exatamente o mesmo, todos os dias! Os jornalistas manifestam aquiescência em unânimes e bovinos movimentos de cabeça. O “republicano público”, idem. Todos os dias, há mais de dois meses!

Na TeleSur, Walter Martinez desmascara esse autismo midiático com seu estilo crítico sutil e cada dia mais implacável.

O herói do governo dos trabalhadores no Brasil faleceu há pouco. Era um empresário que lutou contra o câncer que o matou, tal como fazem quase todos os que sofrem da terrível moléstia, só que, no caso dele, com (muito) mais grana. Um jornal daqui de Minas deu a seguinte manchete: “Um grande lutador, mas sem perder a ternura”. Quer dizer, Che Guevara que se cuide. Mas a “ternura” do empresário não fora bastante para que ele aceitasse se submeter a um exame de DNA por petição de uma moça que alega ser sua filha e que só quer ser reconhecida pelo pai. No prontuário da “ternura” do nosso herói consta também a orientação de sua empresa em só contratar mulheres que comprovassem ligação de trompas. Nos anos 80, o excesso de operações desse tipo na cidade onde ficava a fábrica chamou a atenção das autoridades e processos foram movidos... e, depois, sumiram.

Aliás, a fábrica fora subsidiada pelo governo da ditadura militar para produzir tecidos para a população brasileira e não podia ser vendida a estrangeiros. Mas o esperto empresário vendeu a fábrica sem vendê-la ao vender toda a produção dela por vinte anos futuros para os chineses, os quais trataram de tirá-la do mercado nacional para abri-lo aos tecidos made in China. Depois desse negócio da China, o espertalhão lutador comprou uma cadeira no Senado e viveu feliz para sempre... ou ao menos até que o câncer foi diagnosticado.

Para provar que foi o Osama mesmo que morreu, os caras o jogaram no fundo do mar e não deixaram ninguém fotografar o falecido. Mas disseram que verificaram o DNA do monstro e que foi o corpo dele, com certeza garantida pelos tripulantes de um porta-aviões, que mandaram para as prefundas oceânicas. Esses tripulantes não podem dar entrevistas mas deviam ter conhecido o Osama desde criancinhas pois juraram com uma das mãos sobre a Bíblia e a outra sobre o Corão que era o corpo do próprio que puseram no saco preto. Além do mais, rezaram em coro na ocasião do funeral marítimo em honra do falecido e dos que o assassinaram. Quem não quiser acreditar, que resgate o corpo para conferir. Quem sabe a turma que resgatou as caixas pretas do Airbus topa a parada?

E a feminista Dilma Roussef chorou no caixão do nosso herói, beijando para as fotos o seu heróico rosto, ao mesmo tempo que impunha uma significativa e “feminista” distância diplomática e política da República Islâmica do Irã por causa da “futura apedrejada”.

Haja aspas para estes tempos ásperos, leitor.

Numa edição de jornal televisivo, o âncora “informou” que a descoberta do esconderijo de Bin Laden só foi possível graças aos “novos métodos de interrogatório” praticados na prisão de Guantânamo. E exclamou, inusitadamente, olhando com desafiadora firmeza para os “da poltrona” como se estivesse abrindo e grifando um parênteses “(ou TORTURA, se VOCÊS quiserem!)”. Não queremos não, seu âncora; VOCÊ (e seus patrões) é que quer(em). Na pele dos outros, claro, especialmente de muçulmanos e cucarachas.

No Brasil governado pelos trabalhadores, a reforma agrária foi substituída pelo agronegócio como política de governo, a qual atende pelos nomes Monsanto e Eike Batista.

“Direitos Humanos” tornou-se um termo sem significado objetivo que designa etc... e a palavra “democracia”, entre esses termos, já é puta velha.

O discurso do Obama dando a notícia da morte do Osama foi doidão, foi ou não foi? Bããã... Será a influência do amigo dele da GloboNews, o que mencionei lá em cima?

Nas vizinhanças da Usina Nuclear de Fukushima, antes do tsunami, ia de vento em popa uma campanha anti-tabagista com base no slogan: “Não fume nas ruas, deixe a saúde passar”. Um dos patrocinadores era a empresa dona da Usina. Em parte, foi bem sucedida: não há mais fumantes nas ruas; aliás, não há mais ninguém. Pois o que passou e ainda passa por lá é outra coisa... que não fuma e morava lá há muito tempo sem sair de casa.

Isto pode dar uma série. O leitor pode colaborar.


Post Scriptium: o que está escrito acima “é tudo verdade”, como dizia o Rogério.